Dona da Porrah Toda

"Enquanto você se esforça pra ser um sujeito normal e fazer tudo igual, eu do meu lado aprendendo a ser louco, maluco total, na loucura real..."

ESSA POSTAGEM NÃO É SOBRE O GUILHERME...

ESSA POSTAGEM É PRA VOCÊ QUE TEM CROHN E NÃO SENTE...
Me encanta saber que não sentes, nem dor, nem incômodo, nem nada.

Me encanta tua força, teu jeito de encarar a doença e a forma como leva a vida, sempre tão ávido, enfrentando tudo de uma forma tão de fronte, sem viés para o arrependimento, culpa ou tristeza;

Me encanta, mas nem tanto, porque se contradiz quando se diz forte se não precisa de força para enfrentar a doença, se não dói. Encararia a vida então como todos os outros comuns, apenas levando, apenas vivendo e sendo feliz.

Tua historia me encanta, mas não me convence, pois também sou dessas que não sente tanto quanto os outros, os de crohn mais avançado ou intensificado, aqueles que estão limitados a cama, a cadeira de rodas, aos cuidados dos outros, dependentes.

Da mesma forma que é pra ti incompreensível alguém sentir tanta dor e não melhorar, se deprimir tanto por não ter onde esperar e não se esforçar para enxergar a luz que você vê, me faz não te compreender com essa sua ausência de compaixão, o extermínio completo de sua sensibilidade para entender a dor do outro que acredite você ou não, tem inquestionavelmente, a mesma doença que você.

Eu poderia te culpar amigo (a), dizer que em algum momento você também inventou essa doença ou essa melhora só para ganhar das pessoas a admiração que tem os guerreiros, os herói;
Eu poderia duvidar quando você surgisse algum dia e me dissesse que hoje amanheceu com um pouco de dor, e poderia duvidar mais ainda quando você depuzesse a seu favor nas suas historias de lutas e superações, vitorias sempre tão cobradas por você  sobre a doença, já que hoje, você mesmo já esquecido disso, ignora que também e de alguma forma  já passou por algo, qualquer coisa que lhe deu o rascunho do que é ser um doente de crohn, de retocolite ou "apenas" como julgam muitos, uma sindrome do intestino irritável. Mas eu não tenho nas mãos e nem no coração um julgamento ou uma atribuição de culpa para você; esse texto só tem de mim o propósito de te fazer pensar, humanizar seus sentimentos e a forma como você vê ou tenta "estimular" o outro. Posso ainda te dizer e garantir que a culpa dessa sua descriminação e atribuição do que e quem deve mesmo estar sentindo dor ou não, doente ou não, não seja sua, a culpa na verdade é do crohn, esse autoimune que em uns age de forma branda e com tamanha leveza que quase se duvida e muitas vezes ate se esquece da sua existencia, e em outros de forma tão devastadora, rompendo e destruindo tudo com tanta verocidade e pressa que nos faz duvidar se seria este, a mesma doença habitante entre todos nós.

Ter crohn é assim, parece frescura em alguns, parece câncer em outros, parece a morte para tantos, parece invenção para quem não compreende as melhoras e pioras bruscas e repentinas, parece só psicológico ou emotivo para quem te vê tomando os remédios todos os dias e não apresentando nenhuma melhora ou alguma melhora repentina, mas é física, causa dano, as vezes silencioso, as vezes gritante, é cíclico, se melhorar, parecer que sumiu, um dia bate suave ou fortemente a sua porta, entra e fica ou sai, mas volta, como um marido que saiu para comprar um cigarro, como uma mãe que abandonou seu filho, como a morte, que não avisa, apenas vem. Sejamos coragem, mas sejamos acima de tudo, humanos.

(Gláucia Queiroz - Poeta de crohn)